Representatividade: cadê a fala das mulheres com mais de 30 (40, 50 e +)?
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Eu adoro estar com pessoas de idades diferentes da minha. Aliás, acho que eu gosto de circular por diferentes tribos por nunca ter me sentido muito encaixada numa só turma, então, sempre fui navegando entre várias e aproveitando os encaixes e aprendizados que surgiam.

Outra coisa que eu adoro é descobrir novidade e as redes sociais acabam sendo um bom terreno dessas descobertas. Por isso, acho que, nos últimos tempos, tenho me conectado mais a conteúdos de uma galera bem mais jovem que eu, porque nas redes sociais os jovens acabam dominando as ferramentas e tecnologias, e por consequência também dominam as narrativas.

Isso é muito massa e têm surgido vários movimentos importantes de transformação a partir daí. Acontece que tenho sentido falta de representatividade, de me reconhecer nos discursos, nas imagens e linguagens. Afinal, as questões cotidianas de uma mulher na casa dos 30 são diferentes da realidade de uma mulher de 20 e poucos anos, assim como são diferentes de uma de 60 anos ou mais. Existem pontos que compartilharemos, sim, por termos outros cruzamentos e recortes que coincidem, mas o discurso nem sempre vai corresponder a pontos cruciais que eu vivo aqui na minha pele.

Quando ouço mulheres de 20 e poucos no discurso body positive, por exemplo, me identifico com diversos aspectos. No entanto, existem algumas experiências que passam por outro lugar: a partir dos 30 não é só questão de aceitar seu corpo, mas de reconhecer que ele está se tornando um outro corpo. Colágeno já não tão presente, uns ossos rangendo aqui e ali, um rosto com marcas que antes não existiam. Isso, porque peguei um viés da questão, o âmbito estético, que aliás, já é um baita desafio no universo feminino por uma série de construções sociais.

 

Beleza, envelhecimento e construção social

“Muitas sentem vergonha em admitir que essas preocupações triviais – relacionadas à aparência física, ao corpo, ao rosto, ao cabelo, às roupas – têm tanta importância. No entanto, apesar da vergonha, da culpa e da negação, é cada vez maior o número de mulheres que se perguntam se elas são mesmo totalmente neuróticas e solitárias ou se o que está em jogo tem a ver com a relação entre a liberação da mulher e a beleza feminina. Quanto mais numerosos foram os obstáculos legais e materiais vencidos pelas mulheres, mais rígidas, pesadas e cruéis foram as imagens da beleza feminina a nós impostas.”

 ~ Naomi Wolf, em “O mito da beleza”

O corpo feminino é alvo de controle em inúmeros aspectos, e isso não é diferente no que diz respeito às imposições de padrões sobre o envelhecimento. Foi justamente no artigo de uma jornalista no campo da beleza e bem estar, a Vânia Goy, que li pela primeira vez o termo age shaming, que diz respeito à “noção de que há algo que faz a gente sentir vergonha ou lamentar quando envelhece”. Já reparou que inventaram ser um tabu perguntar a idade de uma mulher? Fazemos piadinhas, escondemos qualquer sinal do tempo passando, do disfarce dos fios de cabelo brancos ao uso de cremes “anti-idade”. Porque se convencionou que é feio e vergonhoso envelhecer.

A nossa cultura e a lógica de mercado inventaram o convencional, e o estabeleceram como o que deve ser visto como maioria, a média, o natural, o que já está dado. Mas se a gente resolvesse se focar em estatística de fato, o que é chamado de “média”, nem sempre a representa. Boa parte dessas “maiorias” são inventadas mesmo e estão ligadas a poder, e não necessariamente ao número de pessoas naquele universo. Não expressam a realidade, mas uma construção de sentido sobre ela.

Onde as imposições da sociedade patriarcal, de consumo e de desempenho vão tocar a experiência da mulher com 30, 40, 50, 60(+) anos? E se junto com essa percepção da idade, a gente fizesse outros recortes em relação a padrões culturais, classe social,orientação sexual, cor da pele, região do país e do mundo, ser ou não portadora de alguma deficiência física, acesso à educação? O que mais entraria na roda? Quais olhares e histórias a gente poderia reconhecer?

 

Representatividade importa

Representatividade importa e quero ouvir o que as mulheres com mais de 30, mais de 40, mais de 50, de 60 e além, têm a dizer. Quero ver rostos reais, com diferentes sinais do tempo, retratados por aí. Acompanhar discussões amplas e profundas sobre as suas experiências na vida.

Cadê a voz dessas mulheres?

Senão elas, quem vai falar sobre como a maturidade influencia em nossos prazeres e orgasmos? Quem vai contar sobre entender melhor seus limites, com ossos rangendo e ressacas que chegam com peso de pata de elefante? E quem vai dizer sobre as pressões específicas em relação a carreira, relacionamentos, visão de mundo, se bancar, lidar com as novas inseguranças, sobre as coragens e liberdades adquiridas, e os etcetéras todos?

Cadê a narrativa dessas mulheres?

Que já tomaram alguns capotes na vida. Que nasceram antes da internet e foram se habituando a ela, enquanto se deparavam com a divisão entre online e offline. Que querem falar de angústias e dores, de conquistas e delícias que fazem parte do seu universo. Que já viveram umas três vidas só nessa vida.

Cadê as mulheres que vivem essas descobertas e perrengues, colocando novidades nas redes também?

A gente têm muito a ganhar com representatividade e expansão de olhar, com diálogo e novas pautas.

Conta para mim: que mulheres incríveis, com mais de 30, 40, 50, 60(+)… você vê pelas mídias e redes sociais? Quero conhecer! E vou apresentar algumas maravilhosas por aqui também – cenas dos próximos capítulos…

 

Confira o podcast com entrevistas de mulheres 30+ aqui.

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Autorretrato com jeitinho vintage, de uma mulher de 36 anos, que foi criança nos anos 80, adolescente nos anos 90 e lembra bem como era um trampo fotografar nessa época.

Comprar o filme, colocar direito na máquina, achar o ângulo pro clique, não tremer, só tem uma chance, esperar preencher todo o filme, ir revelar e se lembrar de fotos que nem sabia que tinha feito, descobrir quais resistiram e quais queimaram, colocar num álbum, voltar a ver de tempos em tempos. Quem lembra, levanta a mão. #tamojunta